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já não há desses manuscritos

por Maria Rita, em 02.02.14

 

 

 

escreve sempre que precisares de me dizer que há gelo nas tuas mãos e nas paredes do frigorífico. os legumes que trouxe ontem não sobrevivem a mais do que uma geada, muito menos nós. escreve sempre que precisares, podes dizer-me outra vez que nunca houve inverno, que este ano não há verão, que estamos aqui e não estamos porque não sabemos se somos nós ou se somos aquelas quatro pessoas que vão à rua agora, encontraram a porta certa. escreve sempre que precisares, faz uma lista de compras, uma lista de desejos, anota todos os pedidos que deixaste em poemas atrasados. escreve sempre que precisares de mais um postal com selo e carimbo. escreve sempre que riscares na tua agenda mais uma morada. sempre que eu precisar vais devolver-me uma caligrafia rebuscada que não é a tua, curvas a mais que não fazias na letra d. já não há desses manuscritos, só eu e os carteiros aprendemos a decifrá-los (e toda a gente sabe que nem isso é verdade). vai escrevendo. sempre que eu precisar, as frases podem desviar deixas decoradas, repetidas como as mentiras, demasiado gastas para serem inócuas. escreve em vez de costurares. mesmo que soubesses, não há remendos suficientes, arranhaste sem possibilidade de cura os joelhos, os cotovelos e as canelas (dançar sempre foi um antídoto fora do teu alcance). escreve que eu vejo nas tuas as minhas quedas, os meus soluços nessas curvas a mais que não fazes na letra d: as tuas linhas são rectas, verticais e justas, as minhas letras são apenas caracteres. escreve sempre que puderes só em vez de apenas, recursos humanos em vez de resíduos urbanos. talvez sejamos mais do que pessoas, temos tamanhos diferentes e não servimos nos lugares que nos foram destinados. escreve sempre que precisares de uma porta onde caibas.

 

 

 

 

 

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publicado às 09:42



68 comentários

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De asimplesvidadejoaorapaz a 18.02.2014 às 17:53

deve ser isso... sem tirar nem por... ;)
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De asimplesvidadejoaorapaz a 18.02.2014 às 19:40

"Tens a luz..." sem dúvida.... ;)
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De Maria Rita a 18.02.2014 às 20:12

uma lâmpada fundida em negras noites...mas vai ficar tudo bem...quando o sol se juntar ao mar!
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De Maria Rita a 18.02.2014 às 21:32

tu sabes tanto!! :)
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De asimplesvidadejoaorapaz a 19.02.2014 às 07:39

como já alguém me perguntou, "tu és campeão em quase tudo ou quase campeão em tudo???
eu respondi-lhe, sou quase campeão em quase tudo...
sei tanto e tão pouco... ;)
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De Maria Rita a 19.02.2014 às 08:51

li no outro dia num blog que sigo e a propósito do quase
" Viver é estar constantemente equilibrado numa balança instável a que chamamos o quase-limite. Estamos sempre quase. Mas nunca estamos lá. É só isso, a adrenalina do quase, do parecer que é agora, que nos faz realmente estar vivos. Tem de parecer que estás quase lá para conseguires manter-te motivado. Não podes estar a milhas, nem podes estar mesmo lá. Alguém que alcançou sempre tudo o que quis é tão falhado como alguém que nunca alcançou tudo o que quis." (pedro chagas de freitas)

o quase do quase é sempre (mais) desafiante.
sabes...sabes sim, muito! :)

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