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Nós, os mirones, praticamos, às vezes, formas muito rebuscadas do nosso vício. Não nos basta espiar e ser indiscretos, não nos contentamos em indagar a vida dos outros – necessitamos absolutamente de ver para além do que pode ser visto, aquilo que a aparência oculta, e até de construir acontecimentos mesmo quando e onde nada parece existir. É por isso que, enquanto caminho pela cidade, gosto de fotografar dissimulada e aleatoriamente as pessoas à minha volta, a ver se, por acaso, o disparo da máquina capta algum movimento interessante, um gesto ou um meneio de cabeça que, uma vez congelados numa só fracção de segundo, mereçam, depois, que perca tempo a reenquadrar e redistribuir as sombras e a luz até ao ponto em que uma imagem banal e desinteressante se transforma num instantâneo fotográfico que possa vender a alguma revista de actualidades (ou de mexericos).
O mais comum é que as imagens assim captadas sejam totalmente desinteressantes e que fiquem tremidas ou desfocadas, sem nenhum préstimo. Quase sempre as apago logo a seguir, assim que as vejo no pequeno monitor da parte de trás da máquina e confirmo que não há ali nada que se aproveite. Mas não esta manhã.